A tecnologia se desenvolve de uma tal forma que me deixa espantada com a gama de possibilidades que ela oferece. Uma dessas é quando o real se torna, de fato, real. Pois existem certas realidades que são distantes de nós, mas que de repente se materializam e se afirmam como fato diante de você. O que antes era uma realidade compreendida nos limites do imaginário, agora é uma realidade concreta.
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Estou lendo um livro, Sinto-me Só, de Karl Taro Greenfeld. Trata-se do relato deste sobre como foi crescer com o irmão Noah, que é autista. É um relato franco e intenso do universo de uma família cuja vida se moldou para cuidar e atender as necessidades de Noah. Karl, um ano e meio mais velho que o irmão, desde que se entende por gente vê sua vida cercada por aquele belo menino que cospe nos outros quando chegam perto, que não fala, que evacua na sala e esfrega os dedos ao lado do ouvido, sentado entre dois sofás. Filhos de mãe japonesa e pai judeu, os meninos tem sua família exposta em programas de tv e diversos artigos e livros (escritos pelo próprio pai), tornando-se, com Noah, um símbolo para as famílias com autistas nos EUA.
Mesmo sabendo que se trata de uma história real, de pessoas reais, na leitura eles acabam se tornando personagens, onde cada ação, cada momento descrito é imagino de forma particular pelo leitor. Cada um que ler Sinto-me Só, irá imaginar o andar torto de Noah de uma forma, as histórias de delitos cometidos por Karl de outra. Basicamente viram personagens de ficcção, pois, afinal, eu no Brasil, em 2010, perdi o acesso visual do que aconteceu na década de 1970 com os Greenfeld.
Engano meu. De curiosa que sou, vou ao Google pesquisar sobre Karl e ver se encontro imagens recentes de Noah (já que o único referencial que tenho é o belo menino sorridente reclinado no irmão da capa do livro). E eis que encontro o Noah, como ele está agora, passados tantos anos. Noah, aquele menininho sobre o qual estou lendo e conhecendo, está ali, mais velho, diante de mim através daquela foto.
Mais curiosa ainda, resolvo procurar no Youtube imagens vivas dos irmãos. Em um momento do livro, Karl fala do incômodo que foi receber a equipe do programa americano 60 Minutes em sua casa, retratando o seu dia a dia, o que seria visto por muitos, inclusive seus amigos da escola. Pesquiso sobre Karl, acho uma reportagem com ele já adulto, que evito ver pois ainda não cheguei ao final do livro. Mas ao lado está lá, "60 Minutes Noah".
Não sei porque, mas pra mim foi um momento estranho ver que aquele momento relatado por Karl, que se passou na década de 1970, estava ali, prestes a ser visto por mim. Tudo o que imaginei, os movimentos dos irmãos, o pai com seus óculos, a mãe pequena e delicada, os surtos de Noah, o passeio próximo à praia, a realidade que eu tenho imaginada se tornaria real. E assim foi.
O real se tornou, de fato, real.
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Há 12, 13 anos atrás eu era uma teen. E fazia o que toda a teen da época fazia: lia Atrevida, Capricho e adorava boybands. A minha preferida (e meio que em segredo) era Hanson. Sei até hoje várias coreografias dos BSB, mas os que me fascinavam mesmo eram os três meninos de Tulsa. Entrentanto, no início da euforia, sem tv a cabo ou internet, me contentava com as revistas que encontrava, as reportagens que de vez em quando saíam no Globinho e na revista Transamérica, e os clips que passavam na tv Manchete. Daí, construía minha própria imagem deles, de como se portavam, o que faziam no dia a dia, o ritmo de seus movimentos. O tempo passou, e finalmente ganhei MTV. Mais um pouco, veio a internet. Estava mais próxima dos meninos, certamente. Via as fotos dos fãs sortudos, tinha acesso ao site oficial desatualizado. Era um universo mais próximo de quem admirava, mas ainda assim um tanto distante, o que ainda me fazia contar com o que imaginava.
Pra mim, de todas essas engenhocas de redes sociais que já inventaram, o Twitter é a mais poderosa e interessante de todas. Um certo paradoxo, pois você escreve somente 140 caracteres por vez, enquanto em outros você pode incrementar seu perfil com todos os seus gostos, e dizer quem é você em um texto digno de testamento. Entretanto, o Twitter aguçou de forma mais profunda possível uma das tendências do ser humano: o vício. Escrever 140 caracteres não diz muita coisa. Mas se você passar o dia escrevendo, a coisa muda de figura. What are you doing?, era a proposta que ele trazia inicialmente. E todos respondem: estou comendo, estou saindo, me arrumando pra festa da @pri. Quer conviver com alguém sem necessitar da presença deste? Siga-o no Twitter.
E não sei porque, os artistas e celebridades acharam que, se o Ashton Kutcher não liga em se expor na engenhoca, eles também não deveriam mostrar resistência. A partir daí, se você tem um ídolo, ele provavelmente terá um Twitter, e você pode acompanhar sua rotina de forma inédita. Diversos membros de boybands de hoje tem Twitter. O Hanson tem Twitter.... eles tem Twitter.... acho que isso era tudo o que eu sempre quis em 1997.
O teen de hoje usufrui de vantagens que eu invejo. Ele vê tudo o que o ídolo faz. Se o cara fez um show ontem, ontem mesmo foi postado no Youtube. O que ele comeu de almoço? O que ele fez durante a tarde? Chegou bêbado em casa? Quais shows ele vai, quem são seus amigos? É só segui-los, que você descobre. E os fãs ainda correm um sério risco de terem suas mensagens respondidas, ou pelo menos receber um thank you por um elogio feito. As antigas cartas eram longas e chatas demais para merecem uma resposta, sendo que esta dava ainda trabalho e gastos com os Correios. Com o Twitter não. De repente, o que era distante e impossível de se conhecer, estava ali, tudo retratado detalhadamente. E direto da fonte.
O real se torna, de fato, real.
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Sim, eu me espanto profundamente com essas coisas.
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Estou lendo um livro, Sinto-me Só, de Karl Taro Greenfeld. Trata-se do relato deste sobre como foi crescer com o irmão Noah, que é autista. É um relato franco e intenso do universo de uma família cuja vida se moldou para cuidar e atender as necessidades de Noah. Karl, um ano e meio mais velho que o irmão, desde que se entende por gente vê sua vida cercada por aquele belo menino que cospe nos outros quando chegam perto, que não fala, que evacua na sala e esfrega os dedos ao lado do ouvido, sentado entre dois sofás. Filhos de mãe japonesa e pai judeu, os meninos tem sua família exposta em programas de tv e diversos artigos e livros (escritos pelo próprio pai), tornando-se, com Noah, um símbolo para as famílias com autistas nos EUA.
Mesmo sabendo que se trata de uma história real, de pessoas reais, na leitura eles acabam se tornando personagens, onde cada ação, cada momento descrito é imagino de forma particular pelo leitor. Cada um que ler Sinto-me Só, irá imaginar o andar torto de Noah de uma forma, as histórias de delitos cometidos por Karl de outra. Basicamente viram personagens de ficcção, pois, afinal, eu no Brasil, em 2010, perdi o acesso visual do que aconteceu na década de 1970 com os Greenfeld.
Engano meu. De curiosa que sou, vou ao Google pesquisar sobre Karl e ver se encontro imagens recentes de Noah (já que o único referencial que tenho é o belo menino sorridente reclinado no irmão da capa do livro). E eis que encontro o Noah, como ele está agora, passados tantos anos. Noah, aquele menininho sobre o qual estou lendo e conhecendo, está ali, mais velho, diante de mim através daquela foto.
Mais curiosa ainda, resolvo procurar no Youtube imagens vivas dos irmãos. Em um momento do livro, Karl fala do incômodo que foi receber a equipe do programa americano 60 Minutes em sua casa, retratando o seu dia a dia, o que seria visto por muitos, inclusive seus amigos da escola. Pesquiso sobre Karl, acho uma reportagem com ele já adulto, que evito ver pois ainda não cheguei ao final do livro. Mas ao lado está lá, "60 Minutes Noah".
Não sei porque, mas pra mim foi um momento estranho ver que aquele momento relatado por Karl, que se passou na década de 1970, estava ali, prestes a ser visto por mim. Tudo o que imaginei, os movimentos dos irmãos, o pai com seus óculos, a mãe pequena e delicada, os surtos de Noah, o passeio próximo à praia, a realidade que eu tenho imaginada se tornaria real. E assim foi.
O real se tornou, de fato, real.
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Há 12, 13 anos atrás eu era uma teen. E fazia o que toda a teen da época fazia: lia Atrevida, Capricho e adorava boybands. A minha preferida (e meio que em segredo) era Hanson. Sei até hoje várias coreografias dos BSB, mas os que me fascinavam mesmo eram os três meninos de Tulsa. Entrentanto, no início da euforia, sem tv a cabo ou internet, me contentava com as revistas que encontrava, as reportagens que de vez em quando saíam no Globinho e na revista Transamérica, e os clips que passavam na tv Manchete. Daí, construía minha própria imagem deles, de como se portavam, o que faziam no dia a dia, o ritmo de seus movimentos. O tempo passou, e finalmente ganhei MTV. Mais um pouco, veio a internet. Estava mais próxima dos meninos, certamente. Via as fotos dos fãs sortudos, tinha acesso ao site oficial desatualizado. Era um universo mais próximo de quem admirava, mas ainda assim um tanto distante, o que ainda me fazia contar com o que imaginava.
Pra mim, de todas essas engenhocas de redes sociais que já inventaram, o Twitter é a mais poderosa e interessante de todas. Um certo paradoxo, pois você escreve somente 140 caracteres por vez, enquanto em outros você pode incrementar seu perfil com todos os seus gostos, e dizer quem é você em um texto digno de testamento. Entretanto, o Twitter aguçou de forma mais profunda possível uma das tendências do ser humano: o vício. Escrever 140 caracteres não diz muita coisa. Mas se você passar o dia escrevendo, a coisa muda de figura. What are you doing?, era a proposta que ele trazia inicialmente. E todos respondem: estou comendo, estou saindo, me arrumando pra festa da @pri. Quer conviver com alguém sem necessitar da presença deste? Siga-o no Twitter.
E não sei porque, os artistas e celebridades acharam que, se o Ashton Kutcher não liga em se expor na engenhoca, eles também não deveriam mostrar resistência. A partir daí, se você tem um ídolo, ele provavelmente terá um Twitter, e você pode acompanhar sua rotina de forma inédita. Diversos membros de boybands de hoje tem Twitter. O Hanson tem Twitter.... eles tem Twitter.... acho que isso era tudo o que eu sempre quis em 1997.
O teen de hoje usufrui de vantagens que eu invejo. Ele vê tudo o que o ídolo faz. Se o cara fez um show ontem, ontem mesmo foi postado no Youtube. O que ele comeu de almoço? O que ele fez durante a tarde? Chegou bêbado em casa? Quais shows ele vai, quem são seus amigos? É só segui-los, que você descobre. E os fãs ainda correm um sério risco de terem suas mensagens respondidas, ou pelo menos receber um thank you por um elogio feito. As antigas cartas eram longas e chatas demais para merecem uma resposta, sendo que esta dava ainda trabalho e gastos com os Correios. Com o Twitter não. De repente, o que era distante e impossível de se conhecer, estava ali, tudo retratado detalhadamente. E direto da fonte.
O real se torna, de fato, real.
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Sim, eu me espanto profundamente com essas coisas.
Comentários
"A ficção é mais real do que a realidade"
Eu acho que você é hoje uma pessoa muito mais inteligente do que serão os teens atuais; porque o real está sempre aí disponível, não há necessidade de cogitar, de pensar, de fantasiar.
Expectativa é tudo.
Beijo
Vitor
P.S.: Você é a primeira pessoa que conseguiu me fazer ver alguma utilidade para o Twitter.
P.P.S.: Desculpe a demora; eu tinha começado a ler seu texto a um tempo atrás, mas algo me interrompeu e depois eu esqueci de voltar